Intuition - Fonoteca Municipal do Porto

Fonoteca Municipal do PortoFMP

Intuition

 Armando Sousa

Resenha

11 Março 2021

Os Linx e a edição independente britânica
No seu número de janeiro de 1981, a revista inglesa NME anunciou a publicação de uma cassete em colaboração com a Rough Trade, que os seus leitores poderiam obter colecionando dois cupões que enviariam para os escritórios da revista juntamente com a soma de uma libra e meia. Esta cassete, compilada por Roy Carr da NME e Christopher Rose da Rough Trade, continha um pout-pourri estilístico que ia do pós-punk à Canterbury scene, incluindo expressões tão diversas como as dos Deutsch Amerikanische Freundschaft, Scritti Politti ou James Cooper Clarke. Em maio desse ano, quando a cassete foi posta à venda, cerca de 25 mil leitores já tinham enviado os cupões para garantir uma cópia da sua C81. Nesta altura, já a Chrysalis se tinha recusado a ceder os direitos para a reedição e portanto, duas músicas da cassete tinham que ser substituídas: Raquel dos The Specials e Don’t Get in My Way dos Linx.

A par dos Level 42 e dos Freeez, os Linx foram um dos grupos de maior sucesso da cena britfunk de princípios dos anos oitenta. Originalmente um sexteto, depois do sucesso do segundo single You’re Lying, a formação ficaria reduzida a um duo formado por David Grant e Peter Martin. Tanto Don’t Get in My Way como You’re Lying foram retiradas do álbum Intuition, que foi publicado em março de 1981, dois meses depois do anúncio da C81 e dois meses antes da sua reedição. A decisão da Chrysalis sobre a não-cedência dos direitos ao projeto da NME talvez possa então ser explicada pelo sucesso de Intuition, a música que deu nome ao LP. Na origem deste fenómeno está o facto de que durante uma greve dos técnicos da BBC, apenas foi possível emitir videoclipes, entre os quais estava o vídeo para a música de Grant e Martin.

O álbum de estreia dos Linx é uma das peças nevrálgicas da música inglesa, onde a estética afro-americana e elementos trazidos do jazz e do funk se fundem de forma elegante com a linguagem pop emergente. Um processo que seria adotado mais tarde, de forma mais ou menos bem sucedida, pelos grupos da new wave britânica, como os Haircut 100 ou os Bow Wow Wow. Das reminiscências caribeñas de Intuition, ao boogie de You’re Lying, passando pela balada soul There’s Love, os Linx navegam ritmicamente empurrados por linhas de baixo pungentes, como nos casos de I Won’t Forget (que bem poderia estar no Regatta de Blanc) e sobretudo Throw Away the Key, talvez a melhor das dez músicas que compõem o álbum.

Quando a NME lançou em 1986 a sucessora da C81, a famosa C86, os Linx já não existiam e o funk, aparentemente adormecido, estava prestes a dar um novo passo na sua longa caminhada por terras britânicas, com o surgimento do acid jazz. No entanto, naquele ano de 1981, por um breve período, houve a ilusão de um aparente convívio entre várias esferas: algumas reencontrar-se-iam inevitavelmente.
 

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